Segundo um estudo francês, os jovens sabem menos sobre a infeção pelo VIH e têm menos confiança no uso do preservativo

28-01-2013 11:14

O primeiro estudo a seis anos sobre atitudes em relação à infeção pelo VIH e comportamentos sexuais de risco na população em geral francesa concluiu que as pessoas mais jovens têm menos receio da SIDA do que anteriormente, têm maior probabilidade de acreditar em vias de transmissão improváveis e menor confiança de que o preservativo proteja contra a infeção pelo VIH.

O estudo concluiu que quase todas as pessoas sabem quais as vias de transmissão mais comuns da infeção pelo VIH, e que os preservativos são parte de uma estratégia contra a infeção e um contracetivo amplamente utilizado, muito mais que anteriormente.

Contudo, verificou uma diminuição considerável relativamente aos estudos anteriores na proporção de pessoas que usaram preservativo durante a última relação sexual, nomeadamente nas relações a longo prazo.

O estudo

O estudo francês sobre “Conhecimentos, Atitudes, Crenças e Práticas” (KABP) foi conduzido em intervalos irregulares desde 1992 e, através da última recolha de dados efetuada em 2010, representa o único estudo longitudinal de 18 anos sobre conhecimentos e práticas da infeção pelo VIH.

Nas palavras dos investigadores: “Do que sabemos, esta é a primeira vez que um país tem dados [KABP] recolhidos durante um período tão longo.”

Uma vantagem do estudo é que o primeiro, em 1992, foi conduzido antes da primeira campanha de sensibilização para a infeção pelo VIH em França e assim estabelece algumas medidas de base sobre conhecimentos e práticas. O estudo é especificamente dirigido à população geral e não a grupos em risco, como os homens gay, pessoas que usam drogas por via injetada e migrantes.

Os estudos, realizados em 1992, 1994, 1998, 2001, 2004 e 2010 foram conduzidos de forma aleatória, para números de telefone da população geral, abrangendo pessoas com idades compreendidas entre os 18-69 anos. Para o estudo de 2010, devido ao facto de a maioria das pessoas não utilizar telefone fixo, foram feitos também telefonemas aleatórios para redes móveis. A taxa de aceitação para responder ao questionário foi razoavelmente consistente, variando de 63% em 1994 para 81% em 2001. Em 2010, 67% dos telefonemas foram feitos para redes fixas e 65% para redes móveis.

No total, foram entrevistadas 26 519 pessoas da população geral, mas para esta análise, foram selecionadas 6 136 pessoas com idades compreendidas entre os 18 e 29 anos, correspondendo 54% a mulheres e 46% a homens. O questionário não perguntou o género dos parceiros sexuais e apenas 2,5% dos homens e 1,4% das mulheres voluntariamente cedeu a informação de que mantinham relações sexuais com o mesmo parceiro desde o ano anterior. O número de entrevistados para o estudo nesta faixa etária variou de 187 em 1994 para 398 em 2004, e para 926 –em 2010.

Resultados: conhecimentos e crenças

O conhecimento sobre as principais vias de transmissão da infeção pelo VIH foi quase universal: em cada estudo conduzido entre 1994 e 2010, mais de 99% dos inquiridos sabia que poderia ser infetado pelo VIH através de relações sexuais desprotegidas e nos três últimos estudos mais de 98,5% sabia que poderia contrair a infeção através da partilha de seringas (estas questões não integraram os questionários nos anos anteriores).

A crença de que a infeção pelo VIH pode ser transmitida por vias improváveis é, contudo, mais comum. Em 1992, 28% dos homens e 17% das mulheres pensava que poderia contrair a infeção através da picada de um mosquito e 9% dos homens e 7% das mulheres acreditava poder infectar-se através da utilização de casas de banho públicas. Em 2010, esta percentagem desceu para níveis de pré-campanha: 31% dos homens e 28% das mulheres no último estudo acreditava que os mosquitos transmitiam a infeção pelo VIH e 21% e 18% respetivamente que poderia contrair a infeção através do uso de casa de banho públicas.

A acompanhar estes dados, uma acentuada descida na crença de que o preservativo poderia prevenir a infeção pelo VIH. Apesar de 9,2% dos respondedores pensar que usar o preservativo reduz a probabilidade de transmissão da infeção pelo VIH, apenas 54% dos homens e mulheres pensam que os preservativos oferecem proteção total, de 100%, para a infeção pelo VIH em 2010, em comparação com 79% dos homens e 76% das mulheres em 1994.

Quando questionados de outra forma, perguntando às pessoas se a transmissão da infeção pelo VIH é possível nas relações sexuais com o uso do preservativo, 40% dos homens e 33% das mulheres, em 2010, reportaram ser possível, em comparação com 15,5% de todos os respondedores do questionário de 1994.

Tal como afirmam os investigadores, esta visão do preservativo pode ser devida à ignorância sobre a sua eficácia, como pode também querer dizer um melhor conhecimento prático sobre as dificuldades de usá-lo e a tendência para rebentar ou deslocar-se.

O conhecimento de alguém seropositivo para a infeção pelo VIH está agora situado nos valores de 1992: em 1992 e 2010, cerca de 10% dos respondedores afirmaram que conheciam alguém seropositivo para o VIH em comparação com mais de 20% em 1998 e 2001, apesar da prevalência da infeção em França ter descido 50% durante este período. Tal, deve-se provavelmente ao facto de o tratamento reduzir os sintomas de SIDA e a uma redução da necessidade de divulgar o estatuto serológico.

As pessoas têm menos receio das consequências da infeção pelo VIH. Em 1992, cerca de 20% dos respondedores tinha medo de “ter SIDA”. Após a campanha de sensibilização, em 1994, quase duplicou para os 44% nos homens e 49% nas mulheres. Contudo, tinha já descido para 25% nos homens e 33% nas mulheres em 1998.

Em 2010, 20% das mulheres e 18% dos homens tinham receio de ter SIDA, número não muito superior relativamente ao medo de ter outras infeções sexualmente transmissíveis (16 e 14% respetivamente).

Tal, foi acompanhado pelo aumento do fatalismo (assintomático) da infeção pelo VIH, especialmente nos homens. Em 2010, 38% dos homens e 33% das mulheres tinha medo de poder estar infetado pelo VIH, subindo para 26 e 28% respetivamente em 1998, quando a pergunta foi pela primeira vez colocada.

Resultados: prática

São as mudanças nas crenças o reflexo das mudanças do uso? A resposta é afirmativa em alguns casos. O uso do preservativo tem permanecido estável, em 62% nos homens e 50% nas mulheres em 1994 e em quase igual proporção agora.

Antes da campanha de sensibilização, um quarto dos homens e metade das mulheres com idades compreendidas entre os 20-29 anos reportaram “nunca” ter usado o preservativo. Sete anos mais tarde, em 1998, esta taxa desceu para os 3,7% nos homens e 7,4% nas mulheres. Desde então, os números duplicaram mas, mesmo assim, no último estudo, apenas 7,5% dos homens e 11% das mulheres respondeu nunca tinham usado o preservativo.

Quando questionados sobre o uso do preservativo na última relação sexual, o número desceu consideravelmente desde os anos 90. Em 1998, 49% dos homens afirmou ter usado o preservativo enquanto que em 2010 desce para 36% (diminuição de 27%). Nas mulheres, estas proporções foram de 38% em 1998 e de 24% em 2010 (diminuição de 37%).

O uso do preservativo em populações de risco – nomeadamente aqueles que reportaram dois ou mais parceiros no ano anterior estabilizou, permanecendo em 57% nos homens e 46% nas mulheres, com pouca alteração desde 1994.

O uso do preservativo nas relações a longo prazo, contudo, desceu consideravelmente; nas relações com a duração de seis meses, a última utilização do preservativo desceu de 60% nos homens e 53% nas mulheres para 41% e 33% quando os parceiros não vivem juntos.

O uso do preservativo nos casais casados ou a viver juntos foi sempre baixo, e de fato as mulheres raramente reportaram o seu uso quando moram com os parceiros; nos homens, desceu de 15 para 9%. As mulheres também reportaram uma descida em 2004, de 71 para 51% no uso do preservativo com parceiros conhecidos há menos de seis meses, apesar de não ser estatisticamente significativo e de não refletir os dados dos homens (75% em 2004 e 72% em 2010). 

As descidas no uso do preservativo não são, em geral, devido a mudanças para outros métodos contracetivos. Enquanto mais pessoas reportam agora o uso de concomitante de preservativos e métodos “médicos” (hormonais, DIU, etc.), a percentagem de pessoas que não usam métodos contracetivos subiu de 9,2% para 19% nos homens (estatisticamente significativo) e de 7 para 12% nas mulheres (estatisticamente significativo).

Conclusões

Os estudos realizados na população geral, como este, são interessantes, mas não demostram a ligação direta entre o conhecimento, comportamento e prevalência da infeção pelo VIH, uma vez que são possivelmente as pessoas que nunca serão expostas ao VIH que pararam de tomar as precauções. O fato de os comportamentos de risco não aumentarem nas pessoas com mais parceiros é relativamente encorajador.

A descida do uso do preservativo nas relações a longo prazo e, em particular, a diminuição da sua imagem como o método mais importante de proteção contra a infeção pelo VIH é impressionante, apesar de, como comentam os investigadores, os jovens poderem estar agora mais preocupados com a gravidez do que com a infeção pelo VIH e de encararem o VIH um pouco pior que outras doenças sexualmente transmissíveis, tendo o preservativo descido na hierarquia de medidas de saúde sexual.

Referência

Beltzer N et al. An 18-year follow-up of HIV knowledge, risk perception and practices in young adults living in France. AIDS, early online publication: DOI: 10.1097/QAD.0b013e32835e1583. 2013.

 

Fonte: www.aidsmap.com

 

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