Vacinação contra vírus do cancro do colo do útero fez desaparecer lesões pré-cancerosas

24-03-2014 14:22

A vacinação contra o vírus do papiloma humano, principal responsável pelo cancro do colo do útero, parecia não servir para tratar lesões pré-cancerosas já instaladas. Cientistas mostraram agora que não é bem assim.

Os resultados preliminares de um pequeno ensaio clínico mostram que, nalgumas mulheres com lesões pré-cancerosas do colo do útero, um tratamento à base de vacinas experimentais contra o vírus do papiloma humano – o HPV, responsável pela grande maioria destes cancros – consegue desencadear uma resposta imunitária capaz de fazer regredir totalmente as lesões.

Os autores do estudo, que publicaram os seus resultados na última edição da revista Science Translational Medicine, esperam que a vacinação terapêutica venha um dia a substituir o actual tratamento deste tipo de lesões, que consiste na sua remoção cirúrgica de forma a impedir que evoluam para uma forma maligna.

Actualmente, as vacinas comercializadas contra o HPV destinam-se a prevenir a infecção do organismo humano por este vírus sexualmente transmissível, nomeadamente nos jovens que ainda não iniciaram a sua vida sexual activa. Porém, essas vacinas não funcionam como tratamento nas pessoas que já foram infectadas quando, através de um esfregaço vaginal de rotina, lhes é detectada uma lesão pré-cancerosa.

Até aqui, foram testadas diversas vacinas experimentais destinadas a tratar as lesões pré-cancerosas já instaladas, mas sem resultados convincentes. Em particular, os especialistas não conseguiram detectar, no sangue das pessoas vacinadas, alterações do sistema imunitário que indicassem sequer que o seu organismo estava a ser estimulado a lutar contra o vírus.

Mas agora, no seu ensaio clínico, em vez de se limitar a analisar o sangue, Cornelia Trimble, da Universidade Johns Hopkins (EUA), e colegas optaram por ir ver, mesmo no interior do tecido lesionado, se a vacinação estaria a surtir algum efeito “escondido”. E descobriram pela primeira vez que algo de significativo estava de facto a acontecer.

Os cientistas vacinaram 12 mulheres que apresentavam lesões pré-cancerosas, ditas "de alto grau", do colo do útero. Todas essas lesões estavam associadas à estirpe do vírus HPV16 – que juntamente com a estirpe HPV18, causa a grande maioria dos cancros do colo do útero.

Diga-se de passagem que as lesões pré-cancerosas de grau inferior podem desaparecer espontaneamente, sem cirurgia – e basta, numa primeira fase, vigiá-las. Mas 30% a 50% das lesões de alto grau dão origem a cancros invasivos – e como não há maneira prever quais o irão fazer, é preciso removê-las em todos os casos.

Três injecções

A equipa utilizou duas vacinas. Uma delas, feita à base de moléculas de ADN, provoca a produção pelo organismo de uma proteína específica do vírus HPV16 presente na superfície das células pré-cancerosas – incitando assim, em princípio, o sistema imunitário das participantes a reconhecer essas células como “inimigas”. A outra vacina, feita à base de um vírus vivo, mas não infeccioso, é capaz de detectar e matar as células pré-cancerosas que apresentam à sua superfície quer a já referida proteína do HPV16, quer uma outra, proveniente do HPV18.

Ao longo de oito semanas, a primeira vacina foi utilizada duas vezes (logo no início e a meio do tratamento), enquanto a segunda vacina foi administrada uma única vez no fim. Um grupo de seis participantes recebeu uma dose alta desta segunda vacina, enquanto outros dois grupos, de três participantes cada, receberam doses diferentes mas mais fracas, escrevem os cientistas. Sete semanas a seguir à terceira injecção (com a segunda vacina), todas as lesões foram removidas cirurgicamente e analisadas.

Os cientistas constataram, em primeiro lugar, que em cinco das mulheres – três das seis vacinadas com a dose mais alta da segunda vacina e uma em cada um dos dois grupos tratados com doses inferiores – as lesões tinham desaparecido. E ainda que as mulheres vacinadas a quem fora removido tecido lesionado após essas 15 semanas apresentavam, no interior das lesões, um significativo aumento dos níveis de linfócitos CD8 – as células “assassinas” do sistema imunitário.

 

Fonte: https://www.publico.pt

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